Agora um texto do Portal Raízes que eu gostaria de compartilhar com vocês, vale a leitura:
Nem todo preconceito gera uma
discriminação. Mas toda discriminação parte de um preconceito. É necessário que
estudemos os nossos preconceitos a fim de que eles não se transformem em
discriminação. Pois, tudo o que o inferno significa está contido na palavra
“discriminação” porque dela flui: a xenofobia, homofobia e todas as outras
palavras usadas para conceituar o comportamento do indivíduo que não aceita as
diferenças. Não aceita ao ponto de odiar aqueles a quem ele julga “diferentes”.
A discriminação quando não
autocriticada pode desencadear fobias. Segundo o pesquisador Paul Errara, a
palavra fobia é derivada da palavra grega para terror ou estrangulamento.
Phobos era um deus grego que causava pânico e medo entre os inimigos daqueles
que o adoravam.
Nos últimos dias assistimos a
notícia de um massacre numa boate gay em Orlando. O atirador homofóbico matou
50 pessoas e 53 ficaram feridas. Se ainda não sabemos lidar com as diferenças
integrais, como saberemos lidar a ‘polissexualidade’?
O professor Leandro Karnal faz
uma relevante proposta de reflexão acerca deste assunto. Fizemos a transcrição
de um trecho de sua palestra: Tolerância ativa.
“Existe uma proposta de um
professor chamado Francis Wolff, num livro chamado Civilização e Barbárie, em
que ele faz a seguinte pergunta: “Quem é o bárbaro atual?”. O livro organizado
pelo professor Adauto Novaes, chama-se Civilização e Barbárie, e um dos
primeiro artigos pergunta “Quem é o bárbaro?”. A tendência grega tradicional
era dizer “Quem é bárbaro é quem não fala grego, quem está fora da minha
cultura. O latino: É bárbaro quem está fora da cultura romana”. Pro chinês é bárbaro todo mundo que não seja
chinês. Bem, o bárbaro era visto como não civilizado. A proposta deste texto é
pensar que a barbárie floresceu, por exemplo, no exemplo citado do nazismo, no
país mais culto da Europa que era a Alemanha. No país que lia Kant em alemão.
Tenta imaginar o que é isso: Ler Kant em alemão. O país que lia Kant em alemão,
produzido Bach e Beethoven. Bom, o país que produziu tanta cultura formal
incendiou uma das crenças mais bárbaras do século 20 e um modelo de barbárie. O
que proponho de novo neste texto?
É bárbaro todo aquele que propõe,
na sua teoria, a exclusão do outro. É
civilizado, seja um índio ianomâmi, ou um alemão, todo aquele que propõe a
aceitação da existência do outro. Então ele foge ao termo Civilização e
Barbárie tradicional, oferece uma saída para esse caminho e vai nos dizer
exatamente isso. Acho que o fundamentalista que prega a eliminação do outro deve
ser tratado como racista, ou seja, como uma patologia ‘educar’ e, segundo caso:
não sendo possível a educação, deve ser encarcerado. Por quê? Porque não é
possível conviver com pessoas que quer lhe excluir da humanidade. Não é
possível.
A não aceitação das diferenças é
problema tanto patológico como baixa inteligência e falta de caráter. Ou uma
combinação das três coisas. O fundamentalismo não precisa ser ‘falta de
caráter’. Eu ainda acho que se pode educar para a Tolerância Ativa, princípio
que eu defendi quando elaborei os cinco volumes para o ensino religioso em São
Paulo, que é o ensino leigo, não baseado em religião. Nós propusemos nesses
volumes o chamado ‘tolerância ativa’. O que é tolerância ativa? Não é que eu
tolero que você seja presbiteriano eu, católico? Não é que eu tolero. Eu acho
fundamental que exista essa diversidade. E não existiria mundo e o mundo seria
um lugar terrível se você não fosse presbiteriano e eu católico. Isso é
tolerância ativa. Não é que eu diga assim: “Até que eu tolero um gay, desde que
não chegue perto”. É fundamental que existam gays. É fundamental pessoas de
diversas etnias, é fundamental que existam diversas opiniões, inclusive
contrárias à minha.
Essas divergências tornam o mundo
um lugar horrível. Quem aceita isso é civilizado. Quem não aceita isso é
bárbaro. Pode falar dez línguas, continuará sendo um bárbaro. Ou seja, eu
compartilho dessa ideia de que o fundamentalista é violento, tal como o
racista, tal como o pedófilo. Tenho que ser reeducado, talvez com uma educação
formal, eletrochoque, prisão, alguma coisa que funcione e, não funcionando, ele
ter de ser isolado da sociedade. Ou talvez se pudesse escolher uma ilha para
onde mandassem todos esses tipos de pessoas que querem excluir os outros. Só os
violentos. Porque se não for a violência, se apenas disser: na minha concepção
você vai para o inferno, isso não me afeta. Isso não me afeta… isso é apenas um
problema de debate. Na verdade, o limite da liberdade é o limite de eu poder me
expressar e a questão da dignidade do corpo, em particular.
Agora, se alguém acha que eu vou
pro inferno por algum motivo, eu também reconheço o direto dessa pessoa também
me mandar pro inferno. Como se atribui a Voltaire, mas também não é dele,
curiosamente, “Eu não concordo com uma palavra do que me dizes, mas defenderei
à morte o direito de dizeres”. Não é dele, mas é uma frase que ilustra bem o
pensamento de Voltaire: tolerância. É fácil ser tolerante com a ideia parecida
com a minha. O difícil é ser tolerante com a ideia oposta à minha. É o choque
entre pólos que não conseguem entender que o outro possa estar correto. E aí as
próprias religiões dão a solução: o primeiro princípio é uma regra áurea, comum
a quase todas as religiões, não fazer ao outro o que não quer que seja feito a
si. Essa regra áurea que Norman Rockwell, que fez um pôster que está na ONU, é
a norma básica: colocar-se no lugar do outro e, segundo os budistas e cristãos,
é compaixão. O que significa isso? Compassione em latim: eu sinto junto. E sentindo
junto eu penso o que perturba o outro. Esse é um exercício fascinante. A
compaixão a todo o momento.
Porque como lembrou Sartre, e de
alguma o Papa Paulo XVI, que era uma pessoa hamletiana, melancólica, né? Como lembrou Sartre: “o inferno são os outros”
e, nós somos o inferno dos outros. Só quem vive feliz é Robinson Crusoé até que
Sexta Feira chegue à sua ilha. Viver em sociedade é uma negociação permanente e
essa negociação é dura. É árdua em vários sentidos”. Leandro Karnal
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